quarta-feira, 30 de março de 2016

18º Seminário de Mecanização

Teve início hoje, em Ribeirão Preto, o 18º Seminário de Mecanização e Produção de Cana-de-açúcar, promovido pelo Grupo IDEA. O evento aborda temas relacionados ao processo de produção de cana e traz detalhes sobre os desempenhos operacionais de novas tecnologias, visando aumentar a produtividade e a competitividade das empresas do setor. Três sessões compõem a programação, com os seguintes temas:

1) Manutenção mecânica, pneus canavieiros e plantio mecanizado - Coordenador: Luiz Antônio Bellini (Bellmec)

2) Meio ambiente, colheita mecanizada e logística - Coordenadores: Dib Nunes Jr. (Grupo IDEA) e Humberto Carrara (Grupo São João)

3) Custos, gestão de frota, novas tecnologias e uso da palha - Coordenador: Luiz Nitsch (Sigma Consultoria Automotiva)

Programa de Regularização Ambiental

O Programa de Regularização Ambiental (PRA) no Estado de São Paulo, regulamentado em 12 de janeiro de 2015 pelo Decreto n° 61.792, é um dos temas do Seminário. O Programa permitirá a restauração de mais de um milhão de hectares de áreas degradadas ou alteradas, ampliando a área de vegetação nativa em propriedades e imóveis rurais paulistas.

Conforme matéria do Portal do Agronegócio, o secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Arnaldo Jardim, afirma que a regulamentação, conduzida em conjunto com as Secretarias do Meio Ambiente e da Casa Civil, representa o empenho por parte do Governo paulista em buscar o equilíbrio entre a produção agropecuária e a preservação ambiental: “O PRA possibilitará a recomposição da vegetação nativa e a preservação das matas ciliares, das nascentes e do solo, garantindo uma agricultura sustentável ambiental e produtivamente, em harmonia com o meio ambiente”.

Ao lado dos benefícios ambientais e do suporte jurídico dado aos agricultores, o Programa pode representar dificuldades para produtores do setor sucroenergético, visto que seu cumprimento é obrigatório e complexo, acarretando custos ao produtor. É sobre esse tema a palestra do advogado e engenheiro agrônomo Paulo Daetwyler Junqueira no Seminário. Ele estima que os produtores rurais terão que arcar, ao todo, com cerca de R$ 1 trilhão para regularizar o passivo ambiental do país.

Junqueira recomenda que as usinas assessorem seus parceiros fornecedores de cana a buscarem a regulamentação ambiental, caso contrário as áreas serão embargadas. Sob embargo, a usina perderá a produção daquela área e a propriedade não poderá fazer financiamento. Além disso, informa matéria do Grupo IDEA, "com a implementação do Programa (...), Junqueira também observa que a área agrícola do estado, inclusive de produção de cana-de-açúcar, poderá ter uma redução. 'Como muitas vezes não será possível comprar uma área do vizinho para atender a legislação, o produtor terá que fazer uma reserva na própria área. Isso reduzirá a área plantada. Por isso, em muitos lugares o canavial vai ter que dar lugar a árvores', prevê o advogado".

Para solicitar a regularização dos imóveis pelo PRA, os proprietários rurais devem estar inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e apresentar o Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas (PRADA) no período de até um ano do início da implantação. A inscrição no CAR vai até o dia 6 de maio de 2016 pelo Sistema do Cadastro Ambiental Rural de São Paulo (Sicar-SP).

Junto ao Seminário acontece a Mostra de Máquinas e Equipamentos Agrícolas, que reúne os principais lançamentos e equipamentos voltados à produção de cana-de-açúcar, e a entrega do Prêmio Usinas Campeãs de Produtividade Agrícola. O 18º Seminário de Mecanização e Produção de Cana-de-açúcar termina amanhã. Mais informações em: http://www.ideaonline.com.br/evento-sobre/18-seminario-de-mecanizacao-e-producao-de-cana-de-acucar

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Mecanização (ou não)

O tempo voa e 2015 já está terminando. Mas o Remoenda ainda traz a última postagem do ano, em que discuto a mecanização das operações nos canaviais, em especial da colheita. O tema já rendeu muitas opiniões conflitantes envolvendo aspectos ligados à sustentabilidade e levou à redução drástica das queimadas no Estado de São Paulo. No entanto, ainda há confrontos entre práticas e normas legais.

Em agosto e setembro de 2015, a União dos Produtores de Bioenergia (UDOP), por meio da TV UDOP, lançou uma série de quatro programas, chamada "Era da mecanização da cana: desafios e oportunidades". Os programas abordam as transformações ocorridas na produção de cana-de-açúcar em decorrência do processo de mecanização associado às determinações legais pelo fim das queimadas nos canaviais paulistas, conforme o Protocolo Agroambiental firmado em 2007. A legislação antecipou o fim das queimadas de 2021 para 2014, nas áreas mecanizáveis, e de 2031 para 2017, nas áreas não mecanizáveis.

Os três primeiros programas da série abordam os temas meio ambiente e trabalhoprodutividade agrícola e tecnologias. O último programa trata do futuro da mecanização do setor. A série destaca impactos positivos da mecanização para o meio ambiente e mudanças na força de trabalho, com redução da quantidade de empregados e aumento do nível de capacitação exigido. No que diz respeito à produtividade, o impacto inicial negativo deve-se às dificuldades de adaptação à mecanização, mas os produtores buscam reverter essa tendência por meio da adoção de tecnologias mais adequadas e inovações, como novas variedades de cana, colhedoras adaptadas, viveiros de mudas, sementes de cana (com lançamento previsto para 2017) e VANTs (veículos aéreos não tripulados) para auxiliar no mapeamento da área cultivada. O aproveitamento da palha para a produção de bioeletricidade e etanol de segunda geração é um ponto positivo decorrente dessa mudança. São entrevistados pesquisadores do CTBE, CTC, UFSCar, produtores, gerentes e diretores de empresas como a Alcooeste, Grupo Clealco e Raízen.

Minas Gerais na contramão

Duas denúncias do Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF/MG) em meados de 2015 chamaram a atenção para crimes relacionados a queimadas e condições de trabalho na atividade canavieira no Estado.

A denúncia por redução de trabalhadores à condição análoga à de escravo e formação de quadrilha recai sobre a quatro empresários paulistas de um grupo econômico composto pelas empresas Alvorada do Bebedouro S/A Açúcar e Álcool, Absolut Participações Ltda, Agrícola Monções Ltda e Asthúrias Agrícola Ltda, conforme relata notícia do MPF. "Durante fiscalizações realizadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Polícia Federal nos anos de 2008, 2011 e 2012, foram encontrados, no total, 2.637 trabalhadores submetidos a regime de trabalho escravo", relata a matéria.

No tocante à denúncia por crime ambiental dirigida à Itaiquara Alimentos S/A, atual denominação da Usina Itaiquara de Açúcar e Álcool S/A, as práticas de queimadas ferem a Deliberação Normativa nº 133/2009 do Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM), que proíbe a queima controlada da cana-de-açúcar na zona de amortecimento de unidades de conservação. A queima da cana-de-açúcar realizada pela Itaiquara teria causado graves danos ambientais ao Parque Nacional da Serra da Canastra e à sua respectiva Zona de Amortecimento, com impactos também à saúde dos trabalhadores e populações vizinhas. Diz a notícia publicada no site do MPF:
Laudo técnico elaborado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) esclarece que o uso do fogo para limpeza de canaviais "provoca a destruição e a degradação de ecossistemas, tanto nas lavouras como próximo a elas, além de ocasionar a liberação de poluição atmosférica altamente prejudicial à saúde, afetando todo o entorno da região canavieira".

Como se vê, ao lado de avanços ainda há conflitos de interesses e progressos pendentes para promover a sustentabilidade da atividade canavieira no Brasil. Taí um bom desejo para o setor em 2016.

domingo, 23 de agosto de 2015

De repente, na lojinha de orgânicos

Imagem: Artigo da revista Biocontact jul-ago/2015. 
Por Flávia Gouveia.

Como de costume, passei na lojinha de produtos orgânicos (chamados produtos "Bio" aqui na França) e peguei a revista gratuita Biocontact, que fala de assuntos ligados à sustentabilidade, alimentação e bem estar. A capa anuncia o dossiê da edição, que questiona os automóveis e aborda meios de transporte alternativos.

Na página 54, um artigo intitulado "Agrocombustíveis: ineficazes para o clima, perigosos para as populações", de Armelle Le Comte, encarregada de advogar sobre questões climáticas e de energia fóssil para a Oxfam França*.

O artigo cita inicialmente a promessa dos agrocombustíveis em reduzir as emissões de gases de efeito estufa e contribuir para a segurança energética dos países produtores, mas em seguida apresenta uma série de críticas, como a ameaça dos agrocombustíveis à segurança alimentar e à biodiversidade, cadeias produtivas dependentes de combustíveis fósseis e incentivos fiscais que representam perdas de arrecadação para atender ao lobby dos produtores.

O texto critica também a falta de critérios de sustentabilidade por parte da União Europeia para a determinação do percentual de agrocombustíveis de primeira geração adicionado aos combustíveis tradicionais (7% até 2020) e termina com recomendações em defesa de agrocombustíveis sofisticados produzidos a partir de dejetos não recicláveis ou que não requeiram terras ou matérias-primas necessárias à agricultura.

Embora o foco do artigo seja a França e a Europa, o tom é geral, mencionando ainda consequências danosas para os países do Sul. A autora aponta que "o impacto negativo das políticas de apoio aos agrocombustíveis é reconhecido pelo conjunto da comunidade científica e denunciado pela sociedade civil internacional".

Fazendo um paralelo com o Brasil, observa-se que o debate acerca da sustentabilidade do etanol de cana brasileiro tem algumas características semelhantes ao debate europeu sobre agrocombustíveis, mas tem também suas particularidades. De toda forma, a discussão internacional representa uma importante influência sobre as discussões brasileiras, como se verá na COP 21, entre os dias 30 de novembro e 11 de dezembro, em Paris.

Estou curiosa para ver como as lojinhas de produtos orgânicos e outros ambientes de alcance público divulgam informações sobre o tema no Brasil, se é que divulgam.
Quem quiser pode ler o artigo na íntegra (em francês) por meio deste link (1).

* A Oxfam França é membro da confederação Oxfam, uma organização internacional de desenvolvimento que mobiliza o poder cidadão contra a pobreza. Trabalha em mais de 90 países a fim de encontrar soluções sustentáveis para colocar fim às inustiças que engendram a pobreza. Seu braço francês atua há 25 anos  em campanhas de mobilização cidadã e de pressão sobre formuladores de políticas.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Cana, etanol e o agronegócio em canções

Imagem: Morguefile

Ao longo da história, a produção da cana-de-açúcar e de seus derivados no Brasil tem recebido também a atenção de pessoas ligadas à produção artística do país. Obras literárias, músicas, sambas-enredo, telenovelas...

E como ocorre em outras áreas, nesta a controvérsia também está presente. Com um passado marcado pela escravidão, as críticas a esse período são evidentes, como se observa na canção Canto da plantação, de Sá, Rodrix e Guarabyra:
Carro de boi descendo a plantação
Levando a cana toda pro patrão
Carro de boi não sabe quem plantou
Carro de boi não sabe quem colheu
Nem quanta coisa que o negro penou
Nem quanta vida chicote comeu
Só pra levar a cana pro senhor
Ah, senhor, braço do negro quer se descansar
Largar a foice e partir pra Aruanda
Sem capitão do mato pra pegar
Ah , senhor tira esse negro da terra cansada
Longe da roda do carro gemendo, gemendo
Sempre a mesma toada.
Após a guinada nos carros flex em 2003, no ano seguinte, a escola de samba Acadêmicos do Salgueiro aceitou a proposta de patrocínio de um grupo de usineiros para homenagear a cana-de-açúcar e o etanol brasileiros, conforme informações da revista científica Brasiliana, da Fiocruz. Naquele ano, a escola ficou classificada em 6º lugar.
A letra, de autoria de Leonel, Luizinho Professor, Serginho 20, Sidney Sã e Professor Newtão, diz assim:
"Caminha" descrevendo nossa terra
Veio da Índia inspiração para o cultivo
Que davam fim a liberdade do nativo
Terra de fartura coberta de cana
Canaã, por natureza
Negro, do açúcar mascavo
Branco toque refinado
Da cobiça holandesa
Academia, é doce seu cantar
Verde eldorado, o encanto "deste lado"
Solo fértil pro meu samba germinar
Pelo tempo, adoçou a economia
Com a evolução, ganhou outro "sabor"
O álcool, o progresso movia
Coisa que Caminha nem imaginou
E mesmo sem destronar o ouro negro
Já desvendaram seus segredos
O nosso jeito de abastecer
Sonho vê-lo enfim em seu reinado
Meio ambiente preservado
Conquistando o "espaço, infinito alvorecer"
A cana que aqui se planta, tudo dá
Dá samba até o dia clarear
O combustível do futuro é brasileiro
É energia que hoje embala meu Salgueiro
Conformando a controvérsia recente, cito a canção Reis do Agronegócio, do último álbum de Chico César, lançado em 2015. Não é uma canção dedicada especialmente à cana ou ao etanol, mas aborda o agronegócio, incluindo o sucroenergético. A letra, de Carlos Rennó, é bastante extensa. Se preferir ouvir, segue o vídeo; depois, a letra.

Ó donos do agrobiz, ó reis do agronegócio
Ó produtores de alimento com veneno
Vocês que aumentam todo ano sua posse
E que poluem cada palmo de terreno
E que possuem cada qual um latifúndio
E que destratam e destroem o ambiente
De cada mente de vocês olhei no fundo
E vi o quanto cada um, no fundo, mente
Vocês desterram povaréus ao léu que erram
E não empregam tanta gente como pregam
Vocês não matam nem a fome que há na Terra
Nem alimentam tanto a gente como alegam
É o pequeno produtor que nos provê
E os seus deputados não protegem, como dizem
Outra mentira de vocês, Pinóquios véios
Vocês já viram como tá o seu nariz, heim? 
Vocês me dizem que o Brasil não desenvolve
Sem o agrebiz feroz, desenvolvimentista
Mas até hoje na verdade nunca houve
Um desenvolvimento tão destrutivista
É o que diz aquele que vocês não ouvem
O cientista, essa voz, a da ciência
Tampouco a voz da consciência os comove
Vocês só ouvem algo por conveniência
Para vocês, que emitem montes de dióxido
Para vocês, que têm um gênio neurastênico
Pobre tem mais é que comer com agrotóxico
Povo tem mais é que comer, se tem transgênico
É o que acha, é o que disse um certo dia
Miss Motosserrainha do Desmatamento
Já o que acho é que vocês é que deviam
Diariamente só comer seu “alimento”
Vocês se elegem e legislam feito cínicos
Em causa própria ou de empresa coligada
O frigo, a múlti de transgene e agentes químicos
Que bancam cada deputado da bancada
Até comunista cai no lobby antiecológico
Do ruralista cujo clã é um grande clube
Inclui até quem é racista e homofóbico
Vocês abafam, mas tá tudo no YouTube
Vocês que enxotam o que luta por justiça
Vocês que oprimem quem produz e quem preserva
Vocês que pilham, assediam e cobiçam
A terra indígena, o quilombo e a reserva
Vocês que podam e que fodem e que ferram
Quem represente pela frente uma barreira
Seja o posseiro, o seringueiro ou o sem-terra
O extrativista, o ambientalista ou a freira
Vocês que criam, matam cruelmente bois
Cujas carcaças formam um enorme lixo
Vocês que expulsam peixes, caracóis
Sapos e pássaros e abelhas do seu nicho
E que rebaixam planta, bicho e outros entes
E acham pobre, preto e índio “tudo” chucro
Por que dispensam tal desprezo a um vivente?
Por que só prezam e só pensam no seu lucro? 
Eu vejo a liberdade dada aos que se põem
Além da lei, na lista do trabalho escravo
E a anistia concedida aos que destroem
O verde, a vida, sem morrer com um centavo
Com dor eu vejo cenas de horror tão fortes
Tal como eu vejo com amor a fonte linda
E além do monte o pôr-do-sol porque, por sorte
Vocês não destruíram o horizonte ainda
Seu avião derrama a chuva de veneno
Na plantação e causa a náusea violenta
E a intoxicação “ne” adultos e pequenos
Na mãe que contamina o filho que amamenta
Provoca aborto e suicídio o inseticida
Mas na mansão o fato não sensibiliza
Vocês já não ´tão nem aí co´aquelas vidas
Vejam como é que o Ogrobiz desumaniza 
Desmata Minas, Amazônia, Mato Grosso
Infecta solo, rio, ar, lençol freático
Consome, mais do que qualquer outro negócio
Um quatrilhão de litros d´água, o que é dramático
Por tanto mal, do qual vocês não se redimem
Por tal excesso que só leva à escassez
Por essa seca, essa crise, esse crime
Não há maiores responsáveis que vocês 
Eu vejo o campo de vocês ficar infértil
Num tempo um tanto longe ainda, mas não muito
E eu vejo a terra de vocês restar estéril
Num tempo cada vez mais perto, e lhes pergunto
O que será que os seus filhos acharão de vocês
Diante de um legado tão nefasto?
Vocês que fazem das fazendas hoje um grande deserto verde
Só de soja, de cana ou de pasto
Pelos milhares que ontem foram e amanhã serão
Mortos pelo grão-negócio de vocês
Pelos milhares dessas vítimas de câncer
De fome e sede, fogo, bala, e de AVCs
Saibam vocês que ganham “c'um” negócio desse
Muitos milhões, enquanto perdem sua alma
Que eu me alegraria se, afinal, morresse
Esse sistema que nos causa tanto trauma
Que a mim não faria falta se vocês morressem
Saibam que não me causaria nenhum trauma
Que eu me alegraria se, afinal, morresse
Esse sistema que nos causa tanto trauma
Ó donos do agrobiz, ó reis do agronegócio
Ó produtores de alimento com veneno...

segunda-feira, 13 de julho de 2015

Carros elétricos e etanol

Imagem: veículos elétricos Autolib' em Paris.  Por Flávia Gouveia.

Os veículos elétricos têm ganhado mercado nos últimos anos. No Japão, representam 11% da frota, nos Estados Unidos, 4%, e no Brasil, apenas 0,04%, segundo dados da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) informados pelo portal Uai. De acordo com o portal, além de serem considerados uma alternativa menos poluente que os veículos a combustão, movidos a gasolina, diesel e etanol, o custo de cada quilômetro rodado com um veículo elétrico é menor.

Japão, Estados Unidos, Alemanha, França, Coreia do Sul e China dominam a tecnologia dos veículos elétricos. O Brasil não desenvolve nem produz carros elétricos, apesar de fabricantes de carros elétricos no mercado mundial possuírem plantas no Brasil (que se dedicam a veículos a combustão). É o que explica o pesquisador Edgar Barassa  que defendeu a dissertação de mestrado “Trajetória tecnológica do veículo elétrico: atores, políticas e esforços tecnológicos no Brasil”, pelo Departamento de Política Científica e Tecnológica da Universidade Estadual de Campinas – em reportagem do Jornal da Unicamp.

A prevalência dos veículos a combustão no Brasil e a ampla infraestrutura de distribuição de combustíveis dificultam a inserção dos veículos elétricos, que requerem eletropostos e baterias eficientes, capazes de conferir uma boa autonomia e vida útil compatível com parâmetros de sustentabilidade. O custo ainda é muito alto, comparado ao de veículos a combustão. Para se ter uma ideia, o veículo híbrido Toyota Prius custa cerca de R$ 90 mil. Ainda assim, o preço caiu consideravelmente: era de R$ 125 mil antes de 2014, quando os híbridos foram incorporados à política setorial do Inovar-Auto – Sistema de Acompanhamento do Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores, que prevê desconto no imposto de importação.

A fabricação de carros elétricos no Brasil ganhou recentemente um incentivo por meio do Projeto de Lei 156/2015, de autoria do deputado federal Roberto de Lucena (PV-SP), que visa à isenção do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) e do Imposto de Importação (II) sobre a comercialização de máquinas, equipamentos, estruturas e outros componentes necessários à fabricação de carros elétricos. O projeto, apresentado em fevereiro deste ano, aguarda a tramitação.

O papel do etanol

Diante do crescimento do mercado de veículos elétricos, como fica o papel do etanol combustível, produzido em larga escala no Brasil? A resposta não é trivial. De acordo com Stella K. Li, presidente da divisão automotiva da BYD (empresa produtora de baterias e veículos elétricos), em entrevista à Folha de S. Paulo de 7 junho de 2014, o carro elétrico é mais sustentável que o movido a etanol. Ela aponta dois problemas relacionados ao etanol: (i) a oscilação de preço decorrente da possibilidade de se transformar a cana também em açúcar e (ii) a característica limpa da energia gerada pelas hidroelétricas no Brasil, o que favorece a sustentabilidade do carro elétrico.

Porém, em 15 de novembro de 2013, o Estadão publicou uma matéria no sentido oposto, tendo como primeiro parágrafo o seguinte texto:
O carro elétrico não é a melhor solução para melhorar o meio ambiente no Brasil - na opinião dos presidentes de duas das maiores fábricas de veículos do Brasil, a Mercedes-Benz e a Fiat. Para eles, o carro a etanol é a mais viável e eficiente alternativa para reduzir a poluição no Brasil.
Os argumentos em defesa do etanol repousam em sua eficiência, infraestrutura adequada e benefícios ambientais. A controvérsia pode ser também observada neste texto de Juan Lourenço, criador do site eco4planet, que apresenta a visão pró-etanol e em seguida argumenta contra.

Entretanto, há quem proponha uma convivência simbiótica entre carro elétrico e etanol no contexto de aumento da demanda do biocombustível no Brasil sem acompanhamento pela oferta. É o que se observa neste artigo do engenheiro Luiz Carlos Porto, diretor técnico da Silva Porto Consultoria Ambiental, publicado em outubro de 2011 no site do escritório de advocacia Brummer. Segundo Luiz Carlos, o carro elétrico tende a ganhar mercado sobre os carros movidos a etanol no Brasil. Porém, ele argumenta que "a eficiência energética das turbinas de geração de energia a etanol é muito maior do que a dos carros. E a eficiência do motor elétrico é muito maior do que a do motor a combustão interna". Assim, o uso do etanol para a geração de energia elétrica poderia ser um aliado na disseminação do carro elétrico no mercado brasileiro.

domingo, 31 de maio de 2015

Inovações em energia solar buscam sustentabilidade

Imagem: Morguefile

De acordo com a Agência Internacional de Energia, a demanda energética mundial irá crescer em um terço nos próximos vinte anos, sendo os países em desenvolvimento responsáveis por 90% desse crescimento. Os combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás natural) são a origem de grande parte da energia consumida no mundo. Apesar de seus reconhecidos efeitos prejudiciais ao meio ambiente e à saúde, esses combustíveis recebem subsídios da ordem de 6,5% do PIB global (US$ 5,3 trilhões), conforme estimativa do FMI. O cálculo inclui os danos causados pela poluição do ar ​​às populações locais e efeitos das alterações climáticas como inundações, secas e tempestades, informa matéria veiculada no Jornal GGN.

Diante dessa realidade, inovações revolucionárias estão em marcha para fazer frente à dependência energética mundial pelas fontes de origem fóssil. No dia 30 de abril, a Tesla, produtora de veículos elétricos por meio da Tesla Motors, lançou a bateria Tesla Powerall, que promete usar a energia solar para tornar as casas totalmente independentes da energia elétrica tradicional, baseada em combustíveis fósseis. A entusiasmante inovação já recebe críticas quando a sua viabilidade, como se observa nesta matéria do IDGNOW!

Apostando também na energia solar, a Caterpillar Inc. lançou este mês uma aliança estratégica com a First Solar para desenvolver microgrids fotovoltaicos para as cidades afastadas, minas, ilhas e instalações industriais nas áreas atualmente sem eletricidade. Segundo matéria do GreenBiz, as novas tecnologias de microgrid podem contribuir com o fornecimento de eletricidade para 19% da população mundial que hoje não têm acesso a esse recurso. No lado crítico, este texto aponta desvantagens dos painéis solares.

No âmbito dos transportes, a ampliação da oferta de energia elétrica de origem solar, renovável e defendida como sustentável, leva a se pensar na solução do carro elétrico. O carro elétrico e o papel do etanol diante desse mercado em ascensão será o tema do meu próximo post. Aguarde!

domingo, 26 de abril de 2015

Sustentabilidade para a bioenergia

Imagem: http://www.publicdomainpictures.net/

Foi lançado no dia 14 de abril na sede da FAPESP o relatório Bioenergy & Sustainability: Bridging the Gaps, resultado de análises sobre a sustentabilidade da produção e do uso da bioenergia desenvolvidas nos últimos dois anos por 137 especialistas de 24 países e 82 instituições.

Os tópicos investigados incluem o uso da terra, fontes de biomassa para bioenergia, integração com a agricultura e silvicultura, água e solo, emissões de gases de efeito estufa, impacto dos biocombustíveis sobre a biodiversidade e os serviços ambientais, assim como questões sociais e econômicas.

Entre as conclusões do estudo, destaca-se que os sistemas de produção de bioenergia com base em práticas sustentáveis ​​podem ajudar a compensar as emissões de gases de efeito estufa resultantes de mudanças de uso da terra ou perda de biodiversidade. As tecnologias e procedimentos compreendem combinações de diferentes matérias-primas, uso de co-produtos, integração da bioenergia com a agricultura, intensificação das pastagens (áreas menores para os rebanhos), zoneamento agro-ecológico, planejamento da paisagem, melhorias na produtividade e outras práticas de gestão da terra adaptadas às condições locais.

Os autores também afirmam que há terras suficientes disponíveis em todo o mundo para a expansão do cultivo de biomassa, sendo a maior parte na América Latina e na África, e que a utilização dessas áreas para a produção de bioenergia não representaria uma ameaça para a segurança alimentar e biodiversidade sob certas condições. Além disso, apresentam evidências de que as tecnologias de melhoria do solo, integração da cadeia de produção e uso de subprodutos de bioenergia em áreas rurais pobres poderia impulsionar o desempenho econômico, melhorar a qualidade dos alimentos, reduzir a poluição e criar empregos.

O trabalho foi coordenado por cientistas ligados a programas de pesquisa da FAPESP em Bioenergia (BIOEN), Mudança Global do Clima (RPGCC), e da Biodiversidade (BIOTA), e teve apoio da FAPESP e do Comitê Científico sobre Problemas do Meio Ambiente (SCOPE), uma organização internacional não governamental. O relatório completo pode ser baixado gratuitamente neste link: http://bioenfapesp.org/scopebioenergy/index.php/chapters

Enquanto isso, na Holanda

Já que o tema deste blog são as controvérsias, ressalto que na mesma semana do lançamento da publicação na FAPESP, aconteceu na Universidade de Tecnologia de Eindhoven, na Holanda, a conferência Biofuels and (ir)responsible innovation, da qual participei apresentando um levantamento histórico do caso brasileiro. Foram apresentados trabalhos e ministradas palestras destacando-se aspectos controversos, promessas e perigos da produção de biocombustíveis para a sustentabilidade, bem como o papel das inovações para promover o desenvolvimento sustentável.

Os estudos apresentados envolveram biocombustíveis de origens diversas (como jatrofa, cana-de-açúcar, soja e palma) produzidos em vários locais, como Reino Unido, Guatemala, Brasil, Turquia, Vietnam, Benin, Burkina Faso, Senegal, Mali, Colômbia e Índia. Temas transversais também foram discutidos. Uma controvérsia muito presente nas discussões do evento foi a que trata da segurança alimentar, expressa na competição entre alimentos e biocombustíveis, em diversos países. De maneira geral, apesar das especificidades de cada local, os temas controversos são recorrentes, incluindo, além da segurança alimentar, discussões sobre as emissões de GEE, certificações, biodiversidade, impactos sociais, entre outros.

No que tange às particularidades locais, as avaliações sobre resultados da produção dos biocombustíveis na sustentabilidade e formas de melhorar esses resultados devem considerar os contextos específicos, características das biomassas e ensinamentos da evolução histórica. A multidisciplinaridade dos participantes e a variedade de aspectos considerados indicaram a importância da união de conhecimentos de diferentes áreas para pensar o tema e soluções pertinentes. Observou-se que o diálogo entre profissionais com diferentes formações deve ser exercitado de forma cooperativa, tal como foi proposto pelos organizadores do evento, em uma atividade realizada em grupos.

Durante o evento, a palestrante Janske van Eijck distribuiu exemplares de seu livro Socio-Economic Impacts of Biofuels in Developing Countries, que pode ser obtido em versão eletrônica neste link. O livro abrange um amplo conjunto de países e tipos de biocombustíveis, e aponta rumos para as ações e pesquisas na área.