quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Uso da água na produção sucroenergética

Imagem: Wikipedia, Timhall.

Em meio à crise hídrica que atinge o Brasil, uma importante discussão diz respeito ao uso da água em processos de produção de derivados da cana-de-açúcar. Além da fase agrícola, emprega-se grande quantidade de água nos processos realizados nas usinas, principalmente para resfriamento de equipamentos e sistemas.

De acordo com o portal novaCana em matéria publicada em 2013, o cultivo de cana-de-açúcar no Brasil não utiliza irrigação, o que reduz impactos ambientais tanto pelo menor uso da água como por evitar arraste de nutrientes, resíduos de agrotóxicos, perdas de solo etc.

A água vem geralmente da chuva, que insiste em não cair em quantidades desejáveis. Nesse caso, a irrigação se faz necessária. Além disso, como a própria matéria informa, o emprego da água na cultura de cana no País está aumentando em virtude da crescente demanda pela incorporação de novas áreas no Cerrado, onde há regiões com déficits hídricos mais acentuados, e no Nordeste, visando a melhorar a produtividade.

O texto traz informações sobre a utilização de água no processo industrial. Nos valores médios de eficiência industrial, o consumo de 0,92 m³/tc (tc = tonelada de cana) corresponderia a 10,8 litros de água por litro de etanol. Porém, por falta de dados sobre a fase agrícola, o cálculo em termos de cadeia produtiva fica prejudicado. Mais difícil ainda é calcular a pegada hídrica do setor sucroenergético, que considera a água utilizada também na produção dos insumos utilizados na cadeia produtiva.

O que diz a Unica

Segundo notícia veiculada pela Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) em novembro de 2014, a indústria de cana-de-açúcar vem reduzindo significativamente a captação de água nos últimos 30 anos.
Graças ao reuso, a retirada média pelo setor caiu de 15 a 20 metros cúbicos por tonelada na década de 70, para a média atual abaixo de dois metros cúbicos por tonelada, com algumas unidades industriais chegando a captar menos de um metro cúbico por tonelada.
A entidade disponibiliza um relatório sobre a sustentabilidade do uso da água pela indústria da cana referente à safra 2012/2013, uma iniciativa em parceria com o Fórum Nacional Sucroenergético (FNS) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI).

No rastro da pegada hídrica

Para quantificar os volumes de água necessários para produção de cana-de-açúcar, etanol e açúcar nos diferentes sistemas de cultivo irrigados em condições de solo e clima característicos do Brasil, a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) formulou um projeto em parceria com outras instituições de pesquisa, conforme noticiado em seu site em outubro do ano passado. Entre os resultados esperados está o fornecimento de informações para subsidiar políticas ambientais e ajudar no avanço de marcos regulatórios para uma produção mais sustentável.

A esse respeito, a dissertação de Mauro Francisco Chávez Rodríguez, intitulada Uso de água na produção de etanol de cana de açúcar e defendida em 2010, informa que :
Segundo Carmo (2008)*, as usinas atuais são perdulárias no consumo de água (...): para cada tonelada de cana entram inicialmente 700 litros de água na usina, são captados mais 1830 litros para processamento dessa tonelada e a água sai da usina na forma de perdas, calculadas em 1919 l/t de cana (por evaporação, no bagaço, nas purgas da lavagem de cana e outras), e nos produtos e subprodutos: açúcar (0,03 l/t), etanol (0,26 l/t), vinhaça (570 l/t), torta de filtro (40 l/t de cana). Conforme o mesmo autor, mesmo com tecnologias convencionais já disponíveis, o consumo de água pode ser significativamente reduzido.
No resumo da dissertação, Mauro afirma:
... o consumo de água na indústria sucroalcooleira de cana de açúcar tem um grande potencial de redução, inclusive oportunidades de haver excesso de água devido à grande quantidade de água carregada pela cana aproveitada por reúsos internos nos processos. Também [se conclui] que a produção de etanol de cana de açúcar como feita atualmente no Estado de São Paulo não ameaça os recursos de água em termos de quantidade, e que numa análise do ciclo de vida incluindo a “água-CO2”, o etanol de cana de açúcar consumiria tanta água na sua produção e uso como a gasolina derivada do petróleo.
Eficiência de tecnologias

Saiu na semana passada, no Valor Econômico, uma notícia veiculada na Revista Canavieiros de que representantes da Câmara Setorial de Equipamentos de Irrigação (CSEI) da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) irão se reunir com o secretário de agricultura do Estado de São Paulo, Arnaldo Jardim, para apresentar dados sobre as tecnologias de irrigação utilizadas no país e defender a eficiência desses métodos.

A preocupação se justifica ante o iminente anúncio do governo do Estado de São Paulo de uma restrição ao uso de água na agricultura, com foco em plantações irrigadas nas bacias hidrográficas em situação crítica em relação ao abastecimento humano. A medida deverá afetar os negócios de produtores rurais, incluindo o setor sucroenergético.

Ineficiência operacional

Por outro lado, estudo divulgado em junho de 2013 pela consultoria GO Associados a pedido da International Finance Coporation (IFC) - braço do Banco Mundial - informa que o Brasil perde 40% da água fornecida pelas concessionárias de saneamento em função de ineficiência operacional.

Conforme notícia da agência Reuters veiculada em junho de 2013, os prejuízos provocados por perdas de água decorrem em sua maior parte de fraudes, furos na tubulação e deficiências operacionais. Os ganhos de um "esforço nacional" para reduzir as perdas de água e aumentar a eficiência energética poderiam chegar a 37 bilhões de reais até 2025, com redução de 50% das perdas correntes.

Usineiros, pesquisadores, governo e produtores de insumos. Posições diferentes sobre o mesmo tema. E em meio à crise atual, todos devem se esforçar para um único objetivo: economizar água.


*CARMO, V.B. Uso da água na produção de etanol de cana-de-açúcar – fase industrial. Em: Workshop “Uso da água na produção de etanol de cana-de-açúcar” – Projeto Programa de Pesquisa em Políticas Públicas. Faculdade de Engenharia Mecânica, Unicamp. Campinas, 2008.

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